O Ministério Público Federal (MPF) vistoriou acampamentos de indígenas Yanomami nos arredores da Feira do Produtor, em Boa Vista, e constatou que cerca de 40 pessoas — entre elas crianças, adolescentes e gestantes — vivem em condições precárias e sem acesso à infraestrutura básica.
A inspeção foi conduzida pelo 7º Ofício da Procuradoria da República em Roraima, órgão responsável pela defesa dos direitos indígenas, em conjunto com a Força-Tarefa da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai). A ação integra o monitoramento dos fluxos pendulares, que envolvem deslocamentos constantes entre comunidades indígenas no sul de Roraima e a capital.
Os acampamentos foram montados em vias públicas e divididos em dois grupos. Os moradores não têm acesso à água potável, saneamento, instalações adequadas de higiene ou abrigo seguro. A proximidade com ruas movimentadas aumenta os riscos para as crianças e gestantes.
Em visitas ao local, o MPF verificou que algumas crianças já foram institucionalizadas por decisão judicial em situações anteriores de risco. Isso mostra que o problema persiste.
A Funai ofereceu transporte de retorno para Terra Indígena Yanomami (TIY), mas os grupos permanecem na cidade. A Secretaria de Estado do Trabalho e Bem-Estar Social (Setrabes) prestou ajuda emergencial com alimentos.
Segundo relatório do MPF, muitos deslocamentos ocorrem pela necessidade de atendimento de saúde especializado ou serviços bancários que não estão disponíveis nas comunidades. Porém, não há estrutura de acolhimento em áreas urbanas para essas famílias.
Após a vistoria, o MPF requisitou providências ao Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei) Yanomami. Também solicitou que a Funai apresente um plano de ação voltado aos fluxos pendulares e ao acolhimento urbano das famílias. O órgão monitorará a atuação do Sistema de Garantia dos Direitos da Criança e do Adolescente (SGDCA) para casos de vulnerabilidade infantil.
O MPF atua nesse campo há mais de dez anos. Em 2019, ajuizou ação civil pública que gerou a criação de uma Base de Proteção Etnoambiental e um posto de saúde na região de Xexena. Parte dos pedidos legais, como responsabilização de Roraima e dos municípios por assistência urbana a indígenas, ainda dependem de decisão judicial.
Entre 2021 e 2023, o MPF chefiou o Grupo de Trabalho Fluxos Pendulares Yawari com vários órgãos, que foi desativado antes que os planos fossem postos em prática. Desde 2023, a presença federal foi reforçada na Terra Indígena Yanomami, com decretação de emergência em saúde pública e elaboração de estratégias interministeriais. Em 2024, a Funai comprometeu-se a reativar o grupo e apresentar plano de ação estável para atendimento indígena em deslocamento.
Também foi construído o Protocolo de Atendimento de Crianças, Adolescentes e Jovens dos Povos Yanomami e Ye’kwana, pela Universidade de Brasília (UnB), pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e pelo Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC). O documento traz diretrizes para atendimento culturalmente sensível e fluxo operacional, mas ainda depende de validação pelas comunidades indígenas para entrar em vigor.