Produtores rurais da Comunidade Nova Morada, na Gleba Jauaperi, e da Gleba Barauana, em Caracaraí (sul de Roraima), relataram, nesta quarta-feira (25), à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Grilagem de Terras denúncias de ameaças de morte e coações por parte de empresários que se apresentam como proprietários das áreas onde os colonos vivem e produzem.
Em 13 de junho, no município de São Luiz, moradores também relataram conflitos com supostos donos das terras e dificuldades enfrentadas junto ao Instituto de Terras e Colonização de Roraima (Iteraima), após a transição das áreas da União para o Estado.
Conflitos com empresários
O primeiro depoente foi Jadiel Mineiro da Silva, que possui 60 hectares na Gleba Jauaperi, dos quais seis são ocupados com plantação de bananas. Segundo ele, a ocupação ocorreu em 2016, por meio da doação da área feita por uma moradora da região. Posteriormente, o Incra confirmou tratar-se de terra pública e iniciou tratativas para um projeto de assentamento.
“Fizemos estrada com facão, marcamos os lotes, plantamos. Em 2018, apareceu um empresário dizendo que era dono, mas quando chegamos, não havia nada lá: nem estrada, nem casa, só mata. E agora ele vem reivindicar a área”, declarou.
Insegurança jurídica e novas disputas
Geilson Lima da Silva, outro morador da Gleba Jauaperi, relatou insegurança jurídica e novas investidas de empresários sobre áreas ocupadas por pequenos produtores.
Geilson afirmou que comprou 15 hectares de uma moradora com documentação desde 1994, mas o conflito se intensificou a partir de 2018, com o início de disputas judiciais.
“O empresário apresentou documentos de outra área para tentar cobrir a nossa. Ele só tem licenças ambientais, nenhuma escritura definitiva”, apontou.
Ainda segundo ele, outro empresário, Genor Faccio, iniciou ação judicial reivindicando parte da mesma área. “Ele nunca apareceu, não tem casa nem plantação. Só apareceu depois que abrimos estrada”, disse.
Ameaças de morte e omissão do Iteraima
Já o produtor Duguai Negrão Ricci, que vive desde 2011 na Gleba Barauana, em Caracaraí, afirmou ter sofrido ameaças de morte dentro do Iteraima, em 2015, diante de testemunhas. O caso foi registrado em boletins de ocorrência. Ele ainda relatou que perdeu o licenciamento ambiental devido à sobreposição de áreas não resolvidas pelo órgão.
Segundo Ricci, um bilhete manuscrito foi anexado ao processo com o pedido para substituir seu nome pelo de outro interessado, um então secretário da Seplan. “Isso foi feito sem nenhum critério técnico”, denunciou.
O produtor também alertou sobre invasões organizadas supostamente ligadas ao Movimento dos Trabalhadores sem Terra (MST). De acordo com ele, há cobrança de até R$ 3 mil por família para ocupar áreas litigiosas. Um dos articuladores citados foi Ariel Banhara, acusado de ameaçar e perseguir produtores em Rorainópolis.
Providências da CPI
A CPI defendeu a convocação dos empresários João Zago, Genor Faccio e Hermelindo Liscano Venceslau para prestarem esclarecimentos. Também propôs vistoria técnica do Iteraima às áreas em litígio.
Renato Silva, relator da CPI, afirmou que apresentará, após o recesso parlamentar, um relatório com indiciamentos. Segundo ele, a medida é motivada pela omissão do presidente do Iteraima, Ionilson Sampaio, que não respondeu a um relatório anterior da comissão.
“Já se passaram 60 dias e o Iteraima não apresentou nenhuma providência concreta. Diante disso, tomaremos medidas. Vamos incluir no novo relatório grileiros, servidores, técnicos e ex-gestores que contribuíram para os conflitos”, afirmou.
Entre os nomes citados está o da ex-presidente do Iteraima Dilma Lindalva Pereira da Costa, acusada pelo relator de utilizar sua influência para favorecer grupos de grileiros.
Sobre a CPI
Instaurada em 20 de fevereiro de 2025, por meio do Ato da Presidência nº 003/2025, a CPI da Grilagem de Terras apura a atuação de uma possível organização criminosa envolvida na ocupação irregular de terras públicas em áreas urbanas e rurais do Estado. Estão entre os principais focos da comissão as glebas Baliza, Equador, Ereu, Cauamé e PDA Anauá.
Em quatro meses de atuação, a comissão já realizou diversas oitivas, colhendo depoimentos que envolvem denúncias de grilagem, ameaças, agressões e danos materiais contra pequenos produtores.